sábado, 23 de junho de 2012

Proseando sobre... Sombras da Noite


Tim Burton retoma sua saudosa parceria com Johnny Depp e com sua esposa Helena Bonham Carter numa fantasia de horror, gênero que domina como poucos. O universo tratado se relaciona a vampiros, é livremente baseado na série televisiva de Dan Curtis, com a disposição da genialidade e notável criatividade do cineasta. De teor gótico e princípio fantástico, acompanharemos uma história que abriga gerações, trazendo clichês do terror – entre eles espíritos rondando por corredores e fantasmas com lençóis – a favor de uma trama atemporal. Ainda soma-se a essa brincadeira neste talvez mais infantil filme do ponto de vista dramático de Burton a geração setentista, as músicas da época e aspectos kitschs dentro da contracultura hippie. E olha, Alice Cooper, Yeah!!! Não faltam piadas relacionadas a esse choque cultural. 

Um problema da narrativa é o distanciamento dos personagens. São tantos e são poucos os que despertam interesse ou pelo menos tem tempo para isso, ficando a maioria distanciada, subjugada não só a serem secundários, mas soando desnecessários, o que não desperta qualquer reação do público por suas ações, às vezes negativamente surpreendentes. Já a disposição dos mesmos em cena é brilhante, característica marcada de seu realizador que utiliza da direção de arte para explorar personalidades e salientar figuras unidimensionais. O visual é o expoente do filme, a máxima de Burton, capaz de conceber universos góticos como poucos, usando esse aspecto a favor da narração e dos gêneros e subgêneros que por vezes destoam vislumbrando outras funções na trama. E é tão bom acompanhar isso, nos levando diretamente a obras análogas, sucessos que tornaram o diretor distinto e Cult. Impossível não se recordar de “Os Fantasmas se Divertem”.  

O ponto inicial é ótimo, alucinante e bem explicado, contando um pouco o passado de seu protagonista, Barnabas Collins (Depp), e o que lhe fez dormir por quase 200 anos acordando na década de 70. Seu caso amoroso com Josette (Bella Heathcote) fora sabotado pela bruxa Angelique Bouchard (Eva Green, ótima), o trauma se arrasta por séculos trazendo conseqüências para sua família que já não dota do mesmo prestígio e riqueza. O despertar pós séculos do vampiro vem em clima de horror com comédia, funcionando sobretudo graças aos típicos trejeitos de Depp que compõe uma figura inusitada, cômica e caricata. Seus gestos e gags são heranças de outros de seus personagens com o acréscimo, talvez involuntário, da dicção do Abe Sapien de “Hellboy”, vivido por Doug Jones. E uma vez mencionar Depp e Green, vale ressaltar que a dupla protagoniza uma das cenas de conotação erótica mais enlouquecida e divertida dos últimos tempos. Quanto a Bonham Carter, essa vive uma psiquiatra, Dra. Julia Hoffman, e participa de uma boa cena baseada na função da hipnose e no poder de influência vampiresca.

Nesse filme de grandes pequenas histórias, as resoluções decepcionam, e mesmo o bom elenco não ajuda. Há bons detalhes que indiciam o que está rolando, como exemplo a cena em que a Dra. Julia entra para tomar café e pede que as cortinas sejam fechadas. O final constrange com surpresas tolas e situações embaraçosas. Chloë Grace Moretz que vem em grande ascensão entrega mais uma atuação intrigante. Muito jovem, se mantém num fluxo de bons momentos na telona, entre eles este aqui, caminhando até um desapontamento final minando a complexidade de sua personagem numa revelação apressada e enfadonha. Sua motivação e razão é nula, afinal, a família Collins ainda buscava uma interação íntima. Os resultados então são ínfimos. Sofrendo da mesma maneira está o pequeno Gulliver McGrath com seu David Collins. Michelle Pfeiffer, ainda dotando de imensa beleza, consegue algum tempo de atenção como a anfitriã Elizabeth Collins, descendente do vampiro. Junto a ela, o ótimo Jackie Earle Haley dá dignidade apreensiva com sua feição marcante ao criado Willie. Jonny Lee Miller que encarna o interesseiro Roger Collins fecha a turma dos esquecidos. Há ainda uma boa ponta de Christopher Lee escondido atrás de barba e chapéu.

Com atributos significativos do gênero que tão bem trabalha, Tim Burton presenteia seus fãs com uma película nova sem força, profundidade e interesse comparada a outras obras passadas, dando um pequeno salto após a fraca adaptação de “Alice”, o que representa uma triste comprovação de declínio. Com muito a fazer pelo cinema e com tanta criatividade atualmente mal distribuída, que Burton mostre que os bons momentos desse “Sombras da Noite” possam referenciar um leve despertar do que há de melhor em sua carreira e significar, mas do que qualquer outra coisa, um sinal de retorno aos seus tempos de maravilhas.  


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