sexta-feira, 20 de julho de 2012

Proseando sobre... Valente


A nova produção da PIXAR se equipara a contos de fadas da Disney, aqueles meticulosos que apresentam famílias em crise, reinos com príncipes e princesas buscando o amor. Tudo muito bonito, mas já encheu! São tantos tão reconhecidos. Ainda soma-se nesta contextualização a intervenção de uma bruxa. Logicamente a comparação se restringe unicamente ao universo criado. A lógica é outra. Ufa. Vindo dos estúdios que já realizou obras como “Toy Story” e “Wall-e”, era de se esperar algo bem mais fértil que um longa de caráter romântico arbitrário com tipificações corriqueiras e um mero felizes para sempre ao final. Isso naturalmente não é um spoiler. Falo sobre o molde costumeiro do era uma vez propriamente dito. Não que isso seja ruim, afinal a animação não foge da idéia da fábula, da fantasia. Pode-se dizer que a PIXAR também se recuperou do tropeço passado, o fraquíssimo “Carros 2”, que manchou uma história de grandiosas concepções. 

Acompanhamos Merida, uma menina de cabelos ruivos que cresceu admirando a força e gana por combate do pai, o que ia contra os princípios de sua mãe, desejosa em ver a única filha tornar-se uma notável dama e seguir a tradição matrimonial de seu povo. Duas épocas distintas são colocadas: a primeira exposta logo no início quando conhecemos a família da pequena, o dia em que ganhou seu primeiro arco. É coincidentemente o mesmo dia que um ataque de um monstruoso urso causou uma ferida no patriarca. Em outro momento, no presente da trama, Merida está crescida aguardando por um casamento que nunca quis. Passado na Escócia Medieval, o longa traz uma garota heroína, dispensando o pragmatismo de um filme sobre princesas esperando pelo príncipe encantado. 

A PIXAR é ambiciosa e muda o comum centrando dessa vez numa princesa que não quer terminar a história com um beijo apaixonado. Os príncipes propostos aqui são guerreiros provindos de um povo que subjuga a mulher colocando-a a margem de suas ações em guerra. São registros da história da civilização que o diretor Mark Andrews constata em seu primeiro longa – ele dirigiu o ótimo curta “A Banda de um Homem Só”. “Valente” é artisticamente impecável. É de longe a mais rica e detalhada entre todas as produções do estúdio. A beleza exuberante dos cenários impressiona abrangendo o vigor bucólico do cenário, castelos, armas primitivas e campos esverdeados, os mesmos que foram manchados de sangue em conflitos posteriores quando o país lutou por liberdade. Mas isso não vem ao caso. 

Animações carregam morais. Com essa não é diferente. Por mais simplista que pareça e previsível que se revele o arco dramático leva a conotações tradicionais dos tipos de relações e do que um espera do outro, especialmente quando se trata de pais e filhos. A mudança de paradigma é um tabu. Através dos anos muita coisa mudou. Classes que anteriormente eram vistas inferiorizadas ganharam seu espaço e respeito com respaldo na dignidade do humano em sua condição no mundo. Tantas barreiras quebradas são retratos óbvios de tantos filmes, inclusive neste. Sua protagonista ruiva cujos cabelos representam inegavelmente seu aspecto emocional mostra-se corajosa em lutar contra um sistema imposto e conquistar sua individualidade orgulhosa com valentia. 

Escrito por Irene Mecchi e Brenda Chapman, ambas tem um bom currículo envolvido com animações, o filme pincela ideologias enquanto fragmenta visões. Há uma mensagem feminista nas entrelinhas esboçada pelas ações e reações dos personagens ao redor. Dentre brutamontes que se divertem com violência e se alimentam devorando sem zelo, a rainha surge com fineza estabelecendo a diferenciação. Não é difícil notar também o respeito quando esta está presente, ou até mesmo quando sua filha aparece, freando conflitos dado seu desfile marcante e imponente, pondo tudo em ordem. E tratando-se de mulher, a sensualidade das personagens também é exaltada. Não é um dos mais notáveis trabalhos da PIXAR, é até pequeno demais e preocupante dependendo do ponto de vista, porém é ótimo perceber que a exuberância técnica da empresa continua crescendo e que ela siga concebendo ótimos e inesquecíveis personagens.  

 

Um comentário:

  1. Mais um belo texto seu, Marcelo, onde eu concordo em número e grau, hehe. Também fiz uma critica, se quiser dar uma lida, é só ir no http://avozdocinefilo.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir