segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Proseando sobre... Eu Receberia as Piores Notícias dos Seus Lindos Lábios


A beleza que inspira, que se choca com nossa percepção do belo nos fazendo projetar o que contemplamos em jubilo. A musa que encanta cuja lascívia emanada extenua o desejo de quem a vê. “Eu Receberia as Piores Notícias dos Seus Lindos Lábios” é um conto romântico e poético sobre a desordem e as tragédias que envolvem o consumo da beleza levando ao seu desgaste e possível fim. Passado numa população ribeirinha no Pará, o filme explana a sociedade local sobrepondo sua paisagem e as destruições do desmatamento que vem assolando a região de maneira descontrolada. Tal fato relaciona-se diretamente a conduta de seus personagens com o simbolismo de suas idealizações e a extenuação do que outrora lhes fora formoso.

Um trio forma a narrativa. Ernani (Zé Carlos Machado) vislumbra uma cura da terra e das pessoas, expondo discursos ideológicos apoiados por sua crença: ele representa a palavra; Cauby (Gustavo Machado) é um fotógrafo que se permite encantar com belezas e procura a todo instante modelar uma forma ideal que ainda não encontrou em seus modelos: ele representa o olhar; Lavínia (Camila Pitanga) é resgatada pelas palavras e pelo olhar, cada qual sugerindo um destino. Ela é a constituição do desejo apropriado.

O filme tem início com uma mulher nua em pose sexual olhando para a câmera. Uma índia. Nesse momento somos os observadores aturdidos pela composição visual da imagem que conta com um ser sedutor. Ela é a representação da musa. Um fade, e adentramos definitivamente na história. O diretor Beto Brant que já concebeu bons projetos como “Cão sem Dono” e “Crime Delicado” investe numa narração recortada, contando distintos momentos de seus protagonistas como um quebra cabeça ao passo que elabora alusões ao contexto através de elipses. O olhar, algo importantíssimo na trama, salta de lugar a outro, de história a outra, de tempos a outros. Como os recortes de seu fotógrafo que expõe nas paredes retratos de sua estrela, a história mescla vários eventos explorando Lavínia, seu furor e sexualidade. 

Tudo acontece por um sentido nesta trama escrita por Marçal Aquino, – parceiro e amigo do diretor, ele também é dono do romance homônimo que inspirou este filme – com a maioria dos eventos ligados a condição de posse. Os corpos se despem e o desejo carnal aflora. Camila Pitanga se entrega, está nua e isso importa para as pretensões da narrativa que não faz da nudez gratuita. Como foco de idealização, o corpo deve aparecer. E aparece. As cenas esquentam, as cores fortes estilizadas contribuem e a fotografia exerce papel fundamental para elaborar a retratação cálida. A atriz dá fulgor à tempestuosa Lavínia, sempre acometida por sentimentos contraditórios, carregando no olhar uma melancolia confusa.  

Há ainda um importante desencadeador na história que não está presente entre o trio. Um quarto personagem, o jornalista Viktor (Gero Camilo). Ele é amigo próximo de Cauby e, em costumeiros encontros, narra passagens literárias que dizem respeito às ocorrências da trama. Um estímulo externo para o comprometimento de relações. E o resultado disso é penoso, abrigando passado e presente num ciclo de acontecimentos e de omissões fragmentadas em passagens temporais. Servindo também como um potencial filme-denúncia devido aos planos que registram deformidades da floresta amazônica, o longa ainda retrata defesas de humanos frente às frustrações, acarretando a saúde mental e social. Como seu título indica, esta é uma obra de apegos e serenidade reconfortante. E é admirável notar, ao final, um olhar lançado ao público, deixando uma interrogação.

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