terça-feira, 25 de março de 2014

Proseando sobre... 300: A Ascensão do Império



Se esforçando para manter o padrão apresentado pelo diretor Zack Snyder em 300 (300, 2007), esse A Ascensão do Império encontra alguns recursos, ainda que bastante modestos. É divertido e extremamente violento. A tridimensionalidade vem garantir a experiência do público de ser banhado com sangue. Várias e variáveis cenas garantem o balneário vermelho. Pode ser que o filme encontre quem sinta algum prazer com tal sensação. Os homens guerreiros e a ação intensa estarrece o brio dos atos ágeis e ininterruptos freados pelos planos lentos que visam detalhes, tal como fizera Snyder. Quem dirige esse é Noam Murro do drama sentimental Vivendo e Aprendendo (Smart People, 2008).  

Contemporâneo ao que acontece em 300, esse A Ascenção se concentra em outros personagens, mencionando os eventos os quais Leonidas, o Rei de Esparta, está envolvido. Aqui temos mais informações sobre o deus-rei Xerxes (Rodrigo Santoro), tudo o que lhe ocorreu e lhe motivou a cativar um império em seu nome; ao seu lado está sua mentora Artemisia (Eva Green, o melhor motivo para conferir o filme), boa de briga, sedutora e letal. Já o herói é outro, Themistocles (Sullivan Stapleton), o general ateniense que se responsabilizará por dificultar a invasão persa, tempos após a derrota dos 300 espartanos descamisados no estreito da Termópilas. Os embates acontecem sobre a terra e no mar, ambos escurecidos, numa notável preocupação técnica em não deixar escapar algum detalhe que arruíne a fictícia veracidade. 

Tudo na trama envolve pancadaria, até mesmo uma cena de sexo. Tudo é violento e colérico, referenciando a uma guerra e suas proporções colossais. O caminho traçado pelos heróis do filme fica manchado de sangue juntamente a corpos desmembrados. A tensão se acentua até mesmo entre amigos. Ao menos a produção foi corajosa ao assumir a violência acatando a censura. A história, por sua vez, adaptada a partir da graphic novel de Frank Miller, não é lá das melhores. Tem toda uma gana destrutiva com pretensões épicas, todavia é inferior aquela de Leonidas. Os personagens são todos robustos, o elenco enfrenta cenas que parecem difíceis. O fato é que pouco fazem dentro do critério de atuação, uma vez que os efeitos visuais garante as impressões sugeridas. 

Há uma falta de ordem no roteiro que, sem convencer, frustra a expectativa sobre o que seria o longa, apresentando uma história que é ligeiramente descartada, deixando-a para o final como intento para uma futura sequência. A intenção plástica, ao que parece, é reproduzir a graphic novel original, sua estética, possibilitando-a ser projetada na telona. Alguns quadros permanecerão na memória, especialmente o de abertura quando a câmera sobe num eixo mostrando os corpos espartanos amontoados cobrindo o solo de orgulho e perecimento. Esse visual fascinante logo se esgota, é muita pretensão crer que o público ficará extasiado somente com isso. Mas não é só isso conforme mencionado anteriormente, a beleza da trama toda cede a beleza celeste de Eva Green, uma boa atriz deslocada, mas que incendeia frente a tanta inexpressividade e bestialidade.  


sexta-feira, 21 de março de 2014

Proseando sobre... Trapaça

O diretor David O. Russell retoma parceria com Christian Bale e Amy Adams, com quem havia trabalhado no belo O Vencedor (The Fighter, 2010), e com o trio Bradley Cooper, Jennifer Lawrence e Robert De Niro, atores que dirigiu no aborrecido O Lado Bom da Vida (Silver Linings Playbook, 2012). Com eles – e somo ainda a presença de Jeremy Renner e Michael Peña – o diretor cria o seu filme mais convencional. Em sua abordagem de trabalhar com máfias, o diretor parece visitar alguns clássicos, buscar inspiração neles, enquanto delineia um humor negro através de gags e diálogos expositivos, além de manejos de câmeras característicos, com excesso de zooms. Me parece um Martin Scorsese afetado pela cultura pop, extraindo em meio as suas mirabolâncias boas atuações, tal como fizera em seus filmes anteriores.

A fita corre abarcada por escárnio, percebemos logo na primeira cena quando observamos o personagem de Bale colando o próprio cabelo. Não só esta, outras trazem a concepção de farsa, de mentira, direcionando-nos a ideia de trapaça sugerida pelo título nacional. Vem reviravoltas, corrupção, mentiras, roubos milionários. A inspiração de tudo isso é um caso verídico lá dos anos 70, quando o FBI forjou uma operação para capturar alguns políticos. David O. Russell investe pesado no tom da ironia, alcança relativo sucesso em passageiros bons momentos, mas o filme parece não se segurar, é raso demais, uma concepção equivocada de longas com golpistas. Gostamos dos personagens, a situação toda já não agrada tanto assim, talvez pelo viés de humor que o cineasta decidiu trabalhar. É uma louvável e corajosa decisão, sem dúvidas.

Dois autênticos trapaceiros são obrigados a colaborar com um agente do FBI, ambos entram no perigoso mundo da máfia envolvendo políticos e bandidos, transitando entre culpados e inocentes. A história privilegia o núcleo de relações estabelecido entre casais e amantes. Ações individuais mudam os rumos da história inconclusiva e a dinâmica enternece na dúvida dos resultados que a operação visa. Não só isso, as decisões individuais chamam a atenção, foge a lógica, pois desconstrói paradigmas que adotamos como verdadeiros. Hipocrisias englobam tantos personagens que esses ganham profundidade à medida que os interesses avolumam. Devido a essa concepção de personagens distintos e caracterizados, a narrativa termina ficando em segundo plano. Os manejos de câmeras e o roteiro se baseiam quase que unicamente na construção dos intérpretes.

O filme encontra seu grande momento com Jennifer Lawrence dançando “Live and let die” enquanto a sua volta desaba. Tem Christian Bale em estado de graça, numa composição demasiada cômica. É certamente o melhor personagem de Trapaça. As atuações são sem dúvidas o que nos motiva a seguir acompanhando o filme, cada trejeito criado por seus atores fundamentam o método de atuação, garantindo o apreço do público pelos personagens. Na composição final temos o fato: O. Russell é um diretor de atores. Grandes diretores tem que ser. É por isso que ele vem sendo tão celebrado, mas seus últimos filmes não acompanham tal potencial, terminando sem trato e ligeiramente rasteiros, embora geralmente divertidos. Entre decotes e sarcasmo, o filme avança e pouco oferta. Fomos trapaceados quando alguns disseram se tratar de uma obra prima.


Proseando sobre... Sem Escalas

Liam Neeson virou sinônimo de filmes de ação. O cara leva jeito com os papéis. Nos últimos anos, sua filmografia contou com cerca de uma dezena de filmes do gênero que obtiveram relativo sucesso. Dessa vez ele encarna um agente federal responsável pela segurança de um vôo, um vôo que fora sequestrado. Tudo é obscuro. Falsas pistas surgem aos montes e o espectador se pega interessado, atento, tentando desvendar juntamente ao herói o que de fato está acontecendo ali. Várias são as hipóteses tratadas pelo roteiro, o que incita a curiosidade do espectador, tenso diante os acontecimentos que acontecem em pleno vôo, com pessoas morrendo a cada 20 minutos, sob ameaças das mensagens de um misterioso estranho.

Há uma bomba no avião! Se não bastassem os passageiros morrendo, ainda é preciso lidar com essa. Filmado quase que inteiramente num só espaço, o filme entrega a paranoia americana. Tem um herói, Bill Marks (Neeson), manchado por possíveis fracassos passados. Este até tem medo de voar, ou melhor, de decolar, conforme explica para uma passageira (Julianne Moore). Carrega um símbolo supersticioso. Seu anúncio inicia a saga sobre a compreensão de quem é seu protagonista, aparentemente desequilibrado e solitário. Algo sério lhe aconteceu. O roteiro se encarrega de possibilitar vários momentos em que o público junte peças e especule, se entretendo com o infortúnio alheio. Todos são suspeitos. Bill Marks desconfia de todos e todos desconfiam dele. E de um muçulmano. Sempre eles.

Poderíamos supor que Sem Escalas se trata de mais um elementar longa cujo mistério que lhe ronda irá se revelar tal como em ficções convencionais, doido para surpreender o espectador com uma surpresa tola plantada. Previsão equivocada. A direção do espanhol Jaume Collet-Serra favorece muito o filme, não cai em maneirismos costumeiros, engata o suspense e o mantém sem alívios, a não ser por uma cena ou outra, especialmente aquela em que o personagem de Neeson revela em público seu passado. Tal cena está deslocada da trama, marginalizada, como se o roteiro não tivesse encontrado outro recurso para promover seu protagonista, imperfeito, passível de erros. No mais, acerta no tom, na pegada que condensa drama e suspense policial. Collet-Serra e Neeson repetem uma parceria que havia começado em Desconhecido (Unknown, 2011).

De construções narrativas breves e impelidas a reviravoltas, Sem Escalas é uma produção eficiente e competente de um gênero gasto e difícil, especialmente quando este se concentra quase que inteiramente em um só local. As atuações burocráticas não comprometem, o ritmo e a frequência de eventos não dão muito tempo ao elenco de apoio de mostrar  serviço. Quem se garante é mesmo Neeson e sua carranca. Já Moore parece viver uma versão solitária feminina de Marks, sua presença inoportuna – como ela chega no avião, por exemplo – lhe dá mais importância do que merece, tornando-a considerável para o bem ou para o mal. A recente oscarizada Lupita Nyong’o juntamente a Michelle Dockery e Corey Stoll completam o elenco.